quinta-feira, 20 de agosto de 2015

COLEÇÃO ANGELICA A MARQUESA DOS ANJOS

   livro 1- Os amores de Angélica


Angélica ia se casar.

Um mistério cercava a fortuna de seu futuro marido, o temível Joffrey de Peyrac, conde de Toulouse.

Tanto fausto, tanto esplendor ela não imaginara nem nos devaneios mais delirantes de mocinha pobre do interior. Naquele momento, parecia-lhe estar vivendo um sonho ameaçador, em que se prenunciava um destino terrível. O seu destino.

Ainda há pouco, ela dera adeus ao velho castelo da família, aos amores da juventude, à suave existência como Marquesa dos Anjos, doce ninfa dos pântanos e florestas de sua terra natal, Monteloup.

Agora estava à mercê daquele estranho que todos diziam ser um verdadeiro monstro, desfigurado e manco, um mago encantador de mulheres, acusado pela Inquisição de ter pacto com o Demônio. Em sua ingenuidade, Angélica não podia prever que o futuro lhe reservava uma existência excepcional. Ela era uma dessas pessoas marcadas pela sorte: a quem os deuses dariam tudo, mas de quem também pediriam muito em troca...

   livro 2- O Suplício de Angélica


Na manhã de 26 de agosto de 1660, a França está em festa: o jovem e recém-empossado Rei Luís XTV faz sua entrada triunfal em Paris. Enfim, o país emerge da sangrenta época de hostilidades durante a qual seis exércitos se enfrentaram sobre seu solo. Ao lado do rei, o cardeal e ministro Mazarino também marcha vitorioso. O casamento que engendrou para o rei com a infanta espanhola Maria Teresa consagra a aliança com a nação vizinha e importante rival. A paz se consolida... ou quase.

Nas cidades e no campo, o povo, grato pelo fim dos conflitos, esquece as desventuras para aclamar o novo rei e sua rainha. Todos têm motivo para festejar, menos Angélica. Enquanto a França comemora o advento de uma nova era, para ela tem início um período de sofrimento e privações. Seu marido, desaparecido numa nuvem de mistério, está preso incomunicável na Bastilha, onde aguarda julgamento. A ordem de prisão foi assinada pelo próprio rei. Em segredo, Joffrey, o marido, corre o risco de ser esquecido para sempre nas masmorras da famigerada fortaleza-presídio. "O amor", sibila o devasso marquês, "é o preço cobrado às damas formosas nos corredores do Louvre." 

De um momento para outro, Angélica viu-se arrancada do esplendor da corte de Luís XIV e atirada no mais negro infortúnio. O marido a quem tanto amava caíra em desgraça perante a Inquisição e desaparecera nas masmorias da Bastilha, tendo todos os seus bens confiscados. Com o coração partido, abandonada à própria sorte numa Paris estranha e hostil, a garota rebelde de Monteloup esvaía-se na dor de seu desamparo. Por conhecer um terrível segredo de Estado, tornara-se alvo de uma conspiração, que visava silenciá-la. Seus inimigos eram poderosos e ela estava sozinha. Do desespero nascia uma nova Angélica, sem as doçuras e ingenuidades do passado. Agora, resistente à adversidade e cruel com os homens, seria implacável como a fatalidade que decidira seu destino.

   livro 3- Angélica e o príncepe das trevas

"Esta morte será seu dote", arqueja o marginal. "Assim se compra uma bela no reino dos mendigos."


Viúva de um homem condenado à morte na fogueira por feitiçaria, Angélica, sem bens nem fortuna, vagava pelas ruas geladas de Paris. Errante e sem destino, acabara se envolvendo com os mendigos que infestavam o domínio temível e quase inacessível do Pátio dos Milagres, onde nem mesmo a polícia ousava aventurar-se.

A iniciação da doce Marquesa dos Anjos naquele ambiente sinistro ocorreria numa inquietante noite de inverno, num cemitério, com a lua a iluminar o macabro cenário de covas abertas e ossários expostos.


     livro 4- A vingança de Angélica


Angélica começou a sonhar com um novo amor, quem sabe um casamento. Havia mudado de vida, era agora uma próspera burguesa, morando com conforto e fazendo planos ambiciosos.
Depois do suplício no Pátio dos Milagres, entre os mendigos, as misérias do passado pareciam esquecidas. 

Ela só pensava em reencontrar um nome e tornar a ser uma grande dama, ser apresentada à corte em Versalhes, abalar o coração dos príncipes.
Sua vida, contudo, seria palco de uma nova tragédia e de um escândalo, que ameaçariam destruir-lhe as esperanças. Ao mesmo tempo, chegavam-lhe aos ouvidos estranhas revelações sobre a morte do marido, o Conde Joffrey de Peyrac.
Estaria a doce Marquesa dos Anjos condenada ao eterno padecer, à incerteza e a derrota?

    livro 5- Angélica e as Perfidias da corte


Angélica em Versalhes!
Depois de desposar o primo, o cruel Marquês Filipe du Plessis-Bellière, finalmente a ambiciosa Marquesa dos Anjos fora admitida na corte. Levada pela mão do próprio Luís XIV, sentara-se entre as princesas de sangue. Os cortesãos inclinavam-se à sua passagem.


Contudo, apesar da euforia da vitória, Angélica não se esquecera do passado difícil, nem da promessa de que seus filhos nunca mais conheceriam a miséria. Ela própria voltaria a ser uma das mulheres mais prestigiadas do reino




   livro 6- Angélica, a favorita do rei


Angélica não podia viver longe da corte de Versalhes.
Requisitada pelos amigos e admiradores, incluindo-se entre etes o próprio rei, chegava o momento de a bela marquesa deixar seu retiro no castelo do Plessis, onde se refugiara para chorar a morte de Filipe, o segundo marido, e retornar ao palácio.


Mas nem tudo seriam rosas em seu caminho. Embora recebida com honras de princesa, aguardavam-na arriscadas aventuras, nas quais não faltariam o tempero do ciúme e da sedução. Na calada da noite conspiravam inimigos ardilosos




   livro 7- Angélica e o pirata

"Você deve ser belíssima nos braços de um homem por quem esteja apaixonada" suspira o Terror dos Mares. "Queria ser esse homem!"

A chama da esperança voltara a arder no coração de Angélica.

Depois de ter acreditado que o grande amor de sua vida,o Conde Joffrey de Peyrac, estava morto, adquirira uma inabalável certeza de que tornaria a encontrá-lo.

Dez anos haviam se passado desde o macabro espetáculo do marido na fogueira em praça pública.

Parecia a Angélica que vivera várias vidas desde aquela época. Alternara-se entre a mais baixa miséria e o auge da riqueza e da glória. Casara-se de novo, com um nobre de sangue. Reinara sobre o coração do Grande Rei. E agora tudo aquilo se extinguia como um sonho.

Uma coisa era certa: a doce Marquesa dos Anjos jamais voltaria a Versalhes. Em busca de seu amor, ela largaria tudo e partiria em direção ao homem de seu destino.

Que riscos esperavam essa mulher enlouquecida pelo desejo no misterioso e turbulento mar Mediterrâneo, caldeirão infernal de raças, crenças e interesses contrários, onde se digladiavam os piratas, aventureiros, mercadores de escravos? Onde a mulher, moeda de especulação e troca, só podia escolher entre o suplício dos renegados e a servidão nos haréns. Lá, onde brilhava seu amor como uma estrela na escuridão...

   livro 8- Angélica cativa no Harém


Como uma imensa serpente, a caravana estirava-se pelo deserto marroquino, ondulando- através da paisagem avermelhada, sob um céu azul-escuro. Acomodada no dorso de um camelo, Angélica seguia desolada. Cair prisioneira, quando se julgava tão próxima de encontrar seu grande amor, o Conde Joffrey de Peyrac, era desgraça demais!
O que seria dela nas mãos de cruéis muçulmanos, separada do mundo, encerrada num harém como uma odalisca, uma oferenda à voluptuosidade de um déspota impiedoso?

Iria render-se? A mulher que enlouquecera o Terror do Mediterrâneo; que sensibilizara o grão-mestre da Ordem de Malta; que escapara ao invencível Rescator; que insultara o sanguinário pirata Mezzo Morte; enfim, a primeira mulher que enganara o infalível Grão-Eunuco do sultão do Marrocos?
Por que, afinal de contas, não seria também a única escrava do mundo a conseguir fugir de um harém?

   livro 9- Angélica rebelde guerreira

À frente da coluna de revoltosos, atravessando o cenário familiar de árvores, águas e pântanos que lhe moldara a alma, Angélica sentia-se sufocar ao pensar no passado.
Às suaves lembranças de uma infância feliz, vinham sobrepor-se emoções recentes. Como a amarga despedida de rei dos cativos do Marrocos, após a longa odisseia através do deserto. Ou as loucuras que cometera à procura do grande amor de sua vida, -um sonho a esfumar-se a distância como as cidades misteriosas por onde passara.
O rompimento com o rei da França lançara-a de volta ao caos. No entanto, estar entre os lambris suntuosos e as honrarias de Versalhes era o que não lhe convinha.

Sempre fora uma criatura indócil, rústica, apesar de os homens a desejarem pela desmedida formosura. Era a Rebelde do Poitou, bela e sedutora guerrilheira, uma salteadora, mulher-lenda conduzindo os cavaleiros armados ao combate!
Triunfaria sobre o Rei-Sol? Escaparia a sua perseguição? Enfrentar um poder tão denso e sólido requeria explosão, desafio, impetuosidade.
Reencontraria o amor?

   livro 10- Angélica clandestina Maldita


Angélica tomou o caminho das muralhas de La Rochelle. O sol acabara de desaparecer e o vento frio fustigava-lhe os braços seminus. Olhos fixos no horizonte, esperava ver despontar um navio em meio a tantos outros que ali aportavam.
Seria loucura sonhar como uma adolescente cujo coração se emociona de ter sido eleita por um misterioso príncipe dos mares, que por ela renunciaria a tudo? Não era uma mulher desencantada e vivida, marcada pela brutalidade dos homens?

Ah! Era passado o tempo em que seduzira magistralmente todos os grandes senhores da terra e do oceano: Luís XTV, o Rei-Sol; Mulay Ismael, sultão do Marrocos; o temível Rescator, o Mago do Mediterrâneo. Agora, criada anônima, perdida nas ruas de La Rochelle, mal lembrava a mulher fulgurante que tão habilmente sabia manejar as armas de seu sexo.

Não haveria homem que pudesse obter dela o milagre: ressuscitar a antiga alegria do amor, a eclosão misteriosa do prazer, a exaltação da própria fragilidade? "Seria preciso um mago", pensou, voltando o olhar maquinalmente para o mar negro e atormentado onde não surgia nenhuma vela. .

   livro 11- Angélica no barco do amor


A bordo do navio Gouldsboro, sob o comando do temível pirata Rescator, o Mago do Mediterrâneo, Angélica e sua filha de dois anos, Hõnorina, mais um grupo de quarenta protestantes, fugiam à perseguição religiosa de que eram vítimas em La Rochelle. Graças à perícia do comandante, que tão surpreendentemente lhes,propiciara a fuga, e à habilidade dos pescadores huguenotes que os acompanhavam, escaparam por pouco à ameaça das galeras reais francesas que guardavam a saída do porto. 

Assim como haviam escapado na praia onde embarcaram ao ataque dos dragões do rei, que feriram o protetor de Angélica, Mestre Gabriel Berne. Agora, seguiam ao sabor do vento pelo oceano Atlântico, em direção ao poente. No Novo Mundo, uma vida repleta de oportunidades os aguardava..


  livro 12- Angélica no fim do Arco iris

Reconciliados, depois de-quinze anos de angústias e desencontros, haviam desfrutado de uma maravilhosa noite de amor quando foram surpreendidos ainda na cama por disparos de armas de fogo no convés. Era o motim? A animosidade entre os hugúenotes embarcados com Angélica e sua filha Honorina em La Rochelle e a tripulação encabeçada pelo capitão Jason agravara-se desde o trágico episódio envolvendo a jovem Bertille e o mouro Abdullah, que resultara no enforcamento exemplar deste. 

A hostilidade dos huguenotes — arrogantes como os Manigault, desconfiados como os Carrère e moralistas como os Marcelot, pais de Bertille — era ainda alimentada pelo ciúme de Mestre Gabriel Berne, um dos líderes protestantes. Berne indignava-se com o "escandaloso" envolvimento de "Dame" Angélica — até então sua criada e pretensa noiva — com o diabólico e abominável comandante pirata. ...

  livro 13- Angélica na floresta em chamas


Em meados do século XVII, os exploradores franceses do Novo Mundo buscam nas terras do norte dos Estados Unidos e do Canadá tanto índios para converter e peles para comerciar quanto um caminho fluvial que os levasse ao Pacífico.
Entre 1660 e 1680, em expedições em que tomam parte, quase sempre juntos, missionários e comerciantes de peles, ou ainda sieurs atraídos por aventuras, são explorados os lagos Ontário e Ene, o oeste do Superior e a região da bacia de Hudson. A foz do Mississipi chega Robert Cavelier, sieur de La Salle, que ali funda a Luisiânia, em homenagem ao soberano francês Luís XIV.

Vários grupos indígenas viviam na região, destacando-se os algonquinos e os iroqueses. Os primeiros dispersos da costa atlântica até as Montanhas Rochosas, os segundos na bacia inferior do rio São Lourenço.
Os contatos iniciais entre colonos e índios foram amistosos. Diz-se até que os índios ensinaram ao branco o cultivo do milho e o uso de peixe como fertilizante. Mas depois passaram a tomar partido nas lutas entre as colônias francesa e inglesa.
No coração desse mundo efervescente, Angélica e seu marido, o Conde de Peyrac, vão buscar uma vida emocionante.

  livro 14- Angélica e a caçada mortal

A magia de um amor imbatível desafia os poderes satânicos

O extremo norte da América, do Canadá até a baía de Hudson é uma região de invernos rigorosos, com nevadas fortes e constantes, embora os verões quentes,porém curtos,revelem uma terra permeada de lagos,rios e florestas de pinheiros e abetos. Talvez por isso fosse uma das áreas menos habitadas do continente, à época da chegada dos primeiros colonos europeus. Tribos nômades de índios algonquinos e iroqueses repartiam precariamente o território,vivendo da caça e da pesca,e de uma agricultura intermitente.
Os primeiros anos de colonização,tanto para ingleses quanto para franceses, foram anos de fome. Metade dos peregrinos do Mayflower, aportado na Nova Inglaterra em 1620,pereceu de doenças causadas por má alimentação. E também metade dos franceses que chegaram à América de 1535 a 1606 foi vitimada pelo clima rude e pela absoluta falta de recursos. Agora é a vez de Angélica enfrentar esse desafio. Com o marido, os filhos e um punhado de pioneiros, ela segue para o interior da Acádia francesa (atual Maine),para tentar sobreviver nas estepes geladas, num local temido até pelos índios, durante o inverno rigoroso.
"Aqui somos todos malfeitores condenados à forca", declara o Conde de Peyrac. "Por isso sobreviveremos!''
Com o olhar perdido no horizonte gelado das cabeceiras do rio Kennebec, na região sagrada de Wapassu, o Lago de Prata, Angélica torcia as mãos de ansiedade pela volta de seu amor. Se algo acontecesse a Joffrey de Peyrac ao fim daquela perseguição insana, sua vida perderia a razão de ser. Sob o grosso manto de pele de castor, seu corpo arrepiava-se de um frio misterioso, mórbido. O corpo ardente que as mãos dele não cansavam de acariciar nas longas noites de delírio junto à lareira da alcova. Noites de paixão!
Por que aquela maldição os perseguia onde quer que fossem? Por que pretendiam separá-los? Não bastavam os quinze anos de infortúnios no Velho Mundo, os desencontros no Oriente, a fuga desabalada através do oceano e da floresta repleta de perigos?
Banidos de seu país de origem,estavam prisioneiros das estepes brancas da América,prisioneiros do silêncio,do espaço infinito,melancólico e deserto. Mas não permitiriam o triunfo do terror, júbilo dos conspiradores que adoravam os poderes infernais.
Angélica e Peyrac, cúmplices e amantes, unidos pela vida inteira por seu amor imbatível...

  livro 15- Angélica e seu amor proibido



Apesar do interesse do governo de Luís XIV em intensificar a colonização da América francesa, em meados do século XVII o povoamento dos territórios do Canadá e da Acádia esbarra numa série de interesses conflitantes.Em primeiro lugar, a monarquia francesa cometeu o erro de marginalizar os protestantes, com isso afastando a valiosa colaboração de indivíduos e capitais que poderiam tornar mais sólida a ação colonizadora. Depois, a política indigenista iniciada desde Samuel de Champlain em 1608 desagradou aos próprios índios, e acirrou as hostilidades entre os grandes comerciantes de peles, colonos e missionários jesuítas.
A partir da segunda metade do século XVII e por toda a primeira metade do século seguinte, as colônias inglesas da América não cessaram de crescer. Apesar dos constantes conflitos, a intensa pregação religiosa puritana, com seu ideário calvinista, cimenta as bases do futuro e resiste à hostilidade de seus inimigos.
Nesse ambiente de lutas e insegurança, Angélica segue seu destino, rodeada de perigos e surpresas...

Agora, o acaso lhe trazia um amante do passado, o único homem que a atingira no mais profundo de si mesma.
Acaso ou gesto calculado?
Desde que chegara à América, ardilosos inimigos ocultos conspiravam para separá-la do marido, levá-los à ruína. Primeiro em Katarunk, depois em Wapassu. Agora, oferecendo-lhe esse homem irresistível.
No fundo de seu ser, Angélica teria de buscar forças para resistir a essa tentação proibida... ...

  livro 16- Angélica ultrajada



Ciúme e paixão ardiam como brasas em seus corações dilacerados

As instruções do ministro das Colônias de Luís XIV, Jean-Baptiste Colbert, para a Nova França eram de expandir a população, otimizar a agricultura e desenvolver indústrias. No entanto, um um dilema persistia entre os líderes da colônia: deveria a população da Nova França ser formada por habitants (no Canadá e Antilhas francesas, camponeses, agricultores), que cultivassem a terra, ou por voyageurs (viajantes, homens que exploravam o Oeste desde os rios), que levassem o comércio de peles, o catolicismo e a influência francesa por todo o continente?
O preço da expansão era uma nova rivalidade, muito mais perigosa que a representada pelos iroqueses ou holandeses, em menos número. Por trás dos Apalaches,as colônias inglesas pareciam tão assentadas quanto as seigneuries (terras de donatários franceses,os seigneurs). E afinal,na corte em Versalhes,a Nova Terra não passava de um peão,no jogo de xadrez que era a disputa de poder na Europa.
Entre os conflitos dessa sociedade em formação, Angélica vivia as incertezas de um amor ameaçado por interesses obscuros...

“Não me verão derrotada”, reage Angélica às mulheres puritanas. “Não sou culpada como dizem!” No quarto onde a Lua filtrava incidentalmente entre duas nuvens sua luz pálida, Angélica vacilava, tropeçando,chocando-se com as paredes,com móveis desconhecidos. A necessidade de se esconder dos seres hostis e rumores da aldeia lançara-a para a alcova onde no ano anterior ela e o marido haviam se amado.
Num lampejo, tudo voltou com lucidez implacável. O medo, que por um instante a dominara, deixou-a, dando lugar a outra certeza,esmagadora, a de uma irreparável certeza. Colin. O marido sabia. Acusava-a do pior. Os braços enlaçando-a,as mãos buscando seu corpo, os lábios tomando os seus para um beijo interminável. Ela fora vista nua e desfalecendo nos braços de Barba do Ouro.
Como fazer Joffrey compreender, explicar-lhe, fazê-lo admitir... Ao simples nome de Colin ele a mataria. E ela que acreditara que o tempo passado em Wapassu ligara-os para sempre, que seu amor era infalível, inatacável,indestrutível!
Angélica estava só. Uma armadilha fechara-se sobre ela. Emboscada na escuridão, seu corpo todo tremia. Do fundo do precipício,demônios a encaravam com risos de escarninho,com olhos reluzentes...

  livro 17- Angélica e a duquesa diabólica


Apenas a Nova França e a Nova Inglaterra disputavam a hegemonia no norte do continente americano em meados do século XVII. Desde o início desse século os espanhóis não se imiscuíam mais por ali, subjugados por corsários franceses e ingleses, como Francis Drake (morto em 1596). Os castelhanos já não podiam mais dividir o continente americano inteiro apenas com os portugueses, segundo as decisões dos papas.
A baía Francesa (atual Daía Fundy, entre o Mame e a Nova Escócia) era vizinha mais próxima dos ingleses que dos franceses, submetida aos ingleses pelo Tratado de Breda (1660), mas continuava sob influência francesa devido a seus habitantes, aos fortes e povoamentos que conservava.
Era uma região demasiado isolada e abandonada para ser regida por aqueles governos longínquos, na verdade mais ocupados com suas querelas locais do que com as colônias.
Nesse terra selvagem e independente, aberta a um mar de riqueza excepcional, Angélica e seu marido, o Conde Joffrey de Peyrac, foram buscar um futuro próspero.

"Você tem o dom do amor" suspira a Diaba. "Quem me dera possuir essa força!"
Na escuridão da noite sufocante, Angélica arrepiou-se ao ser enlaçada por trás, por braços sinuosos que a imobilizaram. Surpresa, deu-se conta de que não eram braços de homem: eram braços macios, quentes, femininos!
Um relâmpago, cortando as nuvens no horizonte, permitiu-lhe reconhecer, próximo ao seu, o rosto sensual da Duquesa de Maudribourg. Silenciosa e perturbadora, a enigmática benfeitora francesa a fixava com a luz irradiante de seu belo olhar.
Angélica estremeceu como se tivesse diante de si a face de Satã. Aquela mulher diabólica, com suas sucessivas maldades, conseguira separá-la de todos os que lhe eram caros, desde o índio Piksarett, a Abigail, o Padre de Vernon, até seu próprio filho, Cantor, e principalmente seu marido, o Conde Joffrey de Peyrac.
"Deixe-me!", bradou, desvencilhando-se."Você está louca!
Lentamente, como num pesadelo que chegasse ao fim, os braços que a aprisionavam relaxaram o aperto. A silhueta de mulher correndo, como um fantasma branco, fundiu-se com a noite que voltava a fechar-se, aos roncos abafados da tempestade ao fundo.
Angélica permaneceu paralisada por uma certeza obsedante. Com aquela criatura dissimulada nunca haveria entendimento. Qual Serpente surgida das brumas encantadas do Éden, a emissária das Trevas desejava sua destruição, sua perdição... sua morte!

  livro 18-  A satânica rival de Angélica



Os domínios da França no norte da América, em meados do século XVII, unificados por Luís XIV em 1663 sob a denominação geral de Nova França, compreendiam a Acádia (Nova Escócia e regiões vizinhas de Nova -Brunswick, ilha Príncipe Eduardo, partes de Quebec e do Maine) e o território conhecido do Canadá.
O estreitamento das relações entre a Acádia e o Canadá, porém, era dificultado pelas grandes distâncias a percorrer, não só na mata selvagem, como também nos rios congelados no inverno e no oceano infestado de piratas. Acrescente-se a hostilidade dos índios locais agravada pela presença inglesa ou de estrangeiros hostis.
Uma das modalidades de ataque praticada por piratas e saqueadores consistia na provocação de naufrágios. Os navios, atraídos por falsos sinais, naufragavam nos recifes, eram saqueados e seus tripulantes assassinados sem piedade.
Nessa região abandonada, à mercê de criminosos e loucos indesejáveis, muitas vezes mandados pelos responsáveis pelo povoamento da colónia, Angélica foi resgatar seu marido, o Conde de Peyrac, ameaçado pelos poderes de sedução de uma mulher infernal.

"Você é Kawa, a invencível", declara o grande chefe guerreiro. "Deixará o Mal triunfar?"
Na isolada clareira da floresta, de onde se avistava o mar por entre os troncos-avermelhados dos pinheiros, Angélica abandonou-se nos braços tatuados do grande Piksarett, o chefe guerreiro dos narrangasetts. Afundando o rosto na- pele de urso negro com que ele se envolvia, rebentou em, soluços lancinantes.
O sofrimento lhe dilacerava o coração, mas ela não ousava confessar àquele índio, tão senhor de seus sentidos, a dúvida que a torturava. O desejado marido, o Conde Toffrey de Peyrac,já não a amava. Senão, como pudera render-se aos encantos da Duquesa de Maudnbourg, uma sedutora irresistível, dotada de poderes satânicos?
Ao ouvir as palavras de consolo do poderoso selvagem, alçou para ele os olhos desorientados. Outrora, bem soubera combater em pé de igualdade com rivais ardilosas, como a temível Montespan, favorita de Luís XIV. Mas hoje estava em jogo o grande amor de sua vida, e a adversária era muito mais terrível!
Ao longe, as gaivotas sobrevoavam a praia perdida, as casas dispersas na orla da enseada, onde oscilava um navio ancorado. Aproximava-se a hora do confronto com aquela criatura diabólica, inimiga do amor.
Poderia recuar diante de alguém que queria a danaçâo de sua alma?

  livro 19- Angélica e o complô das sombras


Quebec foi o primeiro núcleo de povoamento francês no Canada. Fundada por Samuel de Champlain em 1608, passou a sediar a administração da Nova França, quando esta foi oficializada em 1663 como província real por Luís XIV.
O monopólio da exploração dos territórios canadenses foi entregue desde 1627 à Companhia da Nova França, ou dos Cem Associados (isto é, acionistas), organizada pela Coroa. Mas a colonização sempre esteve intimamente ligada à ação dos missionários jesuítas. Grupos desses missionários fundaram vários núcleos colonizadores (entre os quais o de Ville-Marie, atual Montreal, em 1642), onde os . representantes da Igreja tornavam-se membros dos conselhos locais.
Devido à grande extensão do território e a população reduzida, era precário o domínio da França sobre a colónia. Por isso mesmo, desde Richelieu a Colbert, a metrópole adotou uma política de repressão às minorias (protestantes, judeus e estrangeiros), que poderiam insurgir-se contra o poder.
Angélica e o marido, o Conde de Peyrac, banidos do reino e hostilizados na colónia, buscavam em Quebec, senão o indulto por uma condenação injusta, ao menos o confronto com seus inimigos.
"Você, caída tão baixo!", exclama o emissário do rei. "Um ser adorável, que me enfeitiçou!"
Debatendo-se como uma ave aprisionada, Angélica tentava se libertar do estranho que a atraíra para aquele encontro na noite fria do Canadá. Ao reconhecer o embaixador secreto do rei, cujo rosto iluminara-selum instante pelo luar, ela teve um sobressalto: "Você!" Esse homem, com uma simples palavra, tinha o poder de destruí-los, a ela e ao, marido, o Conde Joffrey de Peyrac.
Seus algozes rondavam por toda parte, como sombras. Antes os ameaçavam no reino, agora os esperavam em Quebec. Para combatê-los precisariam arrancar-lhes a máscara, denunciá-los, desarmá-los. Quem, afinal, urdia contra eles aqueles complôs nas altas esferas: o Padre d'Orgeval, o jesuíta? O Ministro Colbert? As companhias mercantes? A Companhia do Santo Sacramento? Todos juntos, talvez...
Do outro lado do oceano, o rei não os esquecia. Por trás das folhas de condenação, dos relatórios policiais, e daquela história mais recente dos sucessos e conquistas dos últimos tempos, teria Luís XIV suspeitado dá presença da mulher que o desdenhara?
Titubeante, Angélica afastou-se do homem. Ele protestou, quis segurá-la, mas ela recusou com gestos veementes. Escapou, enfim, e se pôs a correr desvairada pela praia...

  livro 20- Angélica rainha de Qebec



Quando, em 1663, Luís XIV transformou a Nova França em província real, englobando a Acádia e o Canadá, Quebec já era o centro administrativo dos poderes civis, militares e religiosos dos territórios franceses na América do Norte. Apenas consolidou-se, nessa ocasião, a interferência direta da Coroa nos negócios da colónia, com a criação de um Conselho Superior. Este incluía, além do governador, o bispo, vários conselheiros e, a partir de 1665, uma nova autoridade, o intendente. A eles competia a administração da justiça e das finanças, além da manutenção da ordem pública.
Aos poucos, as atribuições do governador e do intendente se confundiram, provocando frequentes discórdias entre ambos e prejudicando o governo. Também o papel do conselho restringiu-se, terminando por manter-se apenas como corte de apelação.
Junto a esses prepostos do rei, Angélica e o marido, o Conde Joffrey de Peyrac, recorrem em busca de justiça. Tentam o perdão por uma condenação injusta e talvez, quem sabe, a devolução de títulos e bens indevidamente confiscados.
"Você não precisa de inspiração diz o Conde de Peyrac "Por trás de seu encanto existe magia!"
No castelo de popa do navio Gouldsboro, ancorado na enseada de Quebec, Angélica adornou-se de jóias e cetim para ser recebida pelo Sr. de Frontenac, governador da Nova França e representante na América de Luís XIV, que, um dia, ela desafiara.
A medida que se aproximava hora de desembarcar, vinham-lhe à mente todos os obstáculos que faziam desse encontro uma loucura. O rei da França, os banira um dia, a ela e ao marido, o Conde Joffrey de Peyrac. Durante longos anos, lutaram contra o soberano, que os condenara injustamente. No Novo Mundo, mesmo, muitos franceses do Canadá os consideravam inimigos, aliados dos ingleses.
Agora, ignorando esses entraves políticos, desafiando todas as leis, eles iriam avistar-se com o governador, para negociar um tratado de boa vizinhança. Um primeiro passo para recuperar seu lugar no reino e, quem sabe, um dia, reaver nomes e títulos de que se consideravam indevidamente despojados.
Amanhecia. A luz no interior da cabine esmaeceu. Ao longe, a pequena cidade colonial, perdida nos ermos selvagens do Canadá, parecia espreitá-los, impassível, sonhadora.
Angélica tocou um dos brincos de diamante, ajeitou outra vez algumas mechas de cabelo, antes de se expor aos olhares do mundo. As horas seguintes decidiriam sobre seu destino...

  livro 21- O inesquecivel natal Angélica


Na luxuriante sensual Corte do Canadá, em busca do Perdão Do Rei

O luxo ea ostentação da Alta sociedade de Quebec, desde a posse do Governador Frontenac, na Segunda Metade do Século XVII, fizeram da corte da Nova França Uma miniatura Pitoresca de Versalhes. Com a Diferença de that na América se vivia Mais intensamente.
Não Novo Mundo, Os vastos Projetos de Conquistas e como Lutas OS contra Indígenas e Os ingleses ampliavam OS limites do prazer e atiçavam como Paixões Mais fulminantes. Nessa terra nova, fértil de imprevistos, Onde o Perigo era parte do cotidiano, como PESSOAS, inseguras Quanto Ao dia de Amanhã, queriam aproveitar o momento e se lançavam na vertigem da vida mundana, n'uma Verdadeira febre de gozar a vida.
A história do Canadá E repleta de figuras amorosas e aventureiras. Em Quebec, Onde si recriaram os trajes OS parisienses dos Salões musicais e literários, o Jogo e como festas, um compareciam that como Elegantes senhoras da sociedade, ajudavam a suportar o Longo e entediante de inverno Quase nove meses. Nessa atmosfera de festas e prazeres, Angélica Marido eo, o Conde de Joffrey Peyrac, VAO Esperar o veredicto de Luís XIV Sobre Seu futuro não reino.
"A mulher, Bela e sedutora, Saiu das Águas", Diz um vidente. "É um sequaz de Lúcifer, um Diaba da Acadia! '"
Não Terraço do Castelo Saint-Louis, na Parte Alta de Quebec, Onde um galante e aventureira corte canadense comemorava uma festa da Epifania, Angélica emocionou-se ante um Beleza iluminada da Paisagem noturna da capital de da Nova França. Soluçar um Suavidade do Luar, odesenho irregulares DOS Telhados e das Chamines em Diferentes alturas, o contorno Gelado dos montes longínquos EO vasto desenrolar da planície do rio Saint-Laurent compunham hum Cenário inesquecível.
De Surpresa, o Conde Joffrev de Peyrac, Seu Marido, vindo POR Trás, rodeou-lne uma cintura com o Braço Forte é Sua voz LHE Chegou POR between como explosões dos fogos de artifício. Nas casinhas Lá embaixo, Como num presépio Coberto de neve, Cada habitante acendera Uma vela Atrás da Janela. E foi Como se uma Cidade, soluçar O Céu Resplandecente, tivesse Belos Olhos claros e cintilantes POR Trás dos Vidros avermelhados e amarelo-mel.
Angélica sentiu-se imediatamente transportada parágrafo Aquele paraíso de Segurança e felicidade that um simples Presença fazer Marido LHE criava Ao Redor. Como dificuldades esvaneceram-se:. A iminência do veredicto do Rei, uma trama dos conspiradores e maledicentes
Restava APENAS um Certeza da cumplicidade de Ambos, Marido e mulher apaixonados, Unidos por um amor indestrutível ...

  livro 22- Angélica e o perdão do rei


Esqueceria Luis XIV a única mulher que o havia desdenhado?


O inverno canadense, um dos mais longos e rigorosos do mundo, foi durante muito tempo comparado ao da Sibéria. Com temperatura média de - 12°C, mas que pode chegar a até - 37°C, dura até nove meses nos anos em que é mais rigoroso, com sucessivas tempestades de neve de três a cinco dias.
Na época da colonização, o clima implacável foi responsável por terríveis dramas entre os desbravadores franceses e ingleses. Mesmo os índios, mais acostumados à região nativa, eram também suas vítimas. As baixas temperaturas, que provocavam o congelamento dos rios e a escassez de alimentos, dizimaram expedições inteiras, como a de Jaime Cartier (1535), e produziam o que ficou conhecido como o "mal da terra", o escorbuto. Nas cidades isoladas pelo gelo, a chegada da primavera, com a explosão das cores e o degelo que permitia a navegação e o reatamento dos laços com a Europa, era recebida com euforia pelo retorno à vida.

Em Quebec, a capital da Nova França, Angélica e o marido, o Conde Joffrey de Peyrac, aguardam os navios da França, com os despachos de Luís XIV que irão decidir sobre seus destinos no território francês.

“Para você, minha bela amiga”, confessa o Rei-Sol enciumado, “criei maravilhas!”
Era o grande momento de toda uma vida.
Angélica e o marido, o Conde Joffrey de Peyrac, cercados de toda a sua guarda: os espanhóis, o negro Kuassi-Ba, os oficiais de sua frota, um pelotão de marujos em uniforme branco, entraram na sala do Grão-Conselho, no Castelo Saint-Louis, em Quebec. Lá, diante das maiores autoridades, aguardava-os o governador-geral da Nova França, o Sr. de Frontenac, para a leitura das ordens de Luís XIV.
Em meio ao calor sufocante, Angélica, ansiosa, reconheceu sobre a mesa, nas cartas e documentos oficiais, o sinete grosso do Rei-Sol: os anjos da Glória e da Fortuna, sustentando o escudo com três flores-de-lis, encimados por uma coroa e uma cruz. Então, como num sonho, toda a sua vida passou-lhe de uma vez diante dos olhos: a infância nos bosques de Poitou, o casamento em Toulouse, os infortúnios de Paris, o segundo casamento com Filipe du Plessis, o exílio no Oriente, as perseguições religiosas, até, enfim, as incríveis aventuras no Novo Mundo.
Naqueles papéis, sua sorte estava lançada. Caso o rei se pronunciasse contra eles, teriam de abandonar para sempre o território francês.
Sim, o rei da França ainda podia fazer-lhes muito mal...

  livro 23- Angélica e as feiticeiras de salem


A sobrevivênca de um amor à beira de um abismo de torpezas e mentiras


Fundada por um grupo de peregrinos puritanos ingleses em 1626, a pequena cidade portuária de Salem, situada no nordeste do Estado de Massachusetts, tornou-se famosa quando, em 1692, ali ocorreu uma série de julgamentos por feitiçaria, que ficaram conhecidos como a "caça às bruxas".
Um dos magistrados responsáveis pela condenação retratou-se cinco anos após o julgamento, o que não impediu que dezenove pessoas fossem enforcadas.
A feitiçaria (e a caça às bruxas) sempre existiu na maioria das culturas. As feiticeiras foram culpadas por doenças e desgraças, além de acusadas de obterem seu poder maligno do demônio, em rituais obscenos. No século XIV, a Igreja Católica iniciou violenta perseguição aos feiticeiros (sobretudo mulheres), e até o século XVII milhares de inocentes foram torturados e queimados em fogueiras. No Novo Mundo, entre os pioneiros educados pela Reforma, o medo às bruxas tornou-se histérico, resultando em episódios como o de Salem.

Nessa cidade, seguindo o marido, o Conde de Peyrac, Angélica vive momentos dramáticos entre as famosas feiticeiras...

"Vi-me no instante da morte", confessa Angélica.
"E me achei bela..."
Estendida seminua no grande leito entre brancos lençóis, Angélica suspeitou que finalmente chegara a hora de sua morte. Em meio ao delírio, reviu em imagens os acontecimentos cruciais de sua existência e, segundo diziam, isso ocorria no instante fatal.
O luar de verão penetrava pela janela entreaberta, que trazia até ela o ruído ritmado da ressaca e o chamado dos lobos-marinhos. Estava em Salem, cidadezinha da América cujo nome quer dizer "paz" e cujos habitantes jamais viviam em paz. Por um momento ela poderia jurar que se encontrava em Argel, à procura de seu amor desaparecido: Joffrey! Joffrey!
Levantando os olhos numa última e louca súplica aos céus, avistou os anjos. Viu-os nitidamente, franqueando a soleira do quarto. Tinham tamanhos diferentes, e a mesma beleza irreal, de uma juventude eterna. Mas estavam vestidos de preto, e traziam no peito a infamante marca vermelha!
Eram os Anjos da Morte.
Vinham buscá-la.

  livro 24- O fascínio de Angélica

Os inimigos triunfariam contra um amor tão intenso?

Todos os anos, no início do verão, o governador da Nova França, Sr. de Frontenac, convocava os maiores representantes das Cinco Nações iroquesas para uma reunião de paz. No lugar chamado Cataracuí (atual Kingston, no iago Ontário), que se atingia subindo o no Saint-Laurent, para além de Montreal, eram discutidos os principais pontos de litígio dessa paz franco-iroquesa, sempre precária.
Os iroqueses gostavam de negociar tanto quanto de fazer a guerra. E os representantes da Liga Iroquesa compareciam a essas reuniões de bom grado. Ainda mais que sabiam que, na companhia de Onôncio (a "Alta Montanha", nome dado ao primeiro governador, Montmagny, de estatura imponente), receberiam presentes e realizariam banquetes.

Em pé de guerra, no momento em que Angélica pensava nunca mais separar-se do marido, o Conde Joffrey de Peyrac, os iroqueses foram responsáveis por mais uma separação do casal. E outra vez os inimigos se aproveitam disso...

"Oh! meu querido tesouro", suspira o Conde de Peyrac. "Você tem o dom da felicidade!"
Na proa do navio que descia o rio Saint-Laurent, no Canadá, Angélica perscrutava o horizonte. Dentro em breve, se o vento continuasse favorável, iria encontrar-se novamente com o marido, o Conde Joffrey de Peyrac.
Embalada pelas ondas, deixou seu espírito errar. A traumática experiência em Salem, de onde ressuscitara com os dois filhos gêmeos, Raimundo Rogério e Gloriandra, parecia já envolta na aura de irrealidade do esquecimento. Tantas coisas tinham-se metamorfoseado desde aquele verão!
No entanto, sua viagem a Montreal deixara-lhe um pressentimento funesto. Se a Duquesa de Maudribourg não morrera — e disso já não tinha evidências — poderia ainda prejudicá-los? Sua missão não se encerrara com o fim do jesuíta, o Padre d'Orgeval?
Uma pancada surda tirou-a do devaneio. O canhão da frota de Gouldsboro os saudava. Ao ver o marido imponente no comando das naves, uma certeza a dominou: ninguém podia mais atacar seu amor. Ela, no auge de seu fascínio, ainda era amada por Joffrey, um dos grandes nomes da América do Norte.
Ele era seu rei, sua pátria, seu refúgio

  livro 25- Angélica e a estrela mágica


Magia e simbolismo na trama de um amor indescritível

O jogo foi um dos costumes mais arraigados que os europeus trouxeram para as terras do Novo Mundo. No Canadá,durante os invernos rigorosos que os mantinham ilhados em suas cidades,as diversões nos salões os ajudavam a esquecer dos perigos,a passar o tempo e esquecer a solidão e o tédio das longas noites geladas.
A paixão do jogo entre os colonos franceses, em especial o jogo de cartas, foi de tal intensidade que as autoridades chegaram a proibir a certa altura os jogos de azar de qualquer natureza: "sobretudo a basseta, o faraó, o trinta-e-um, a roleta, o par ou pernão, o quinze, e muitos outros",como ficou registrado nas atas oficiais da época.
Mas alguns colonos levaram também outros tipos de baralhos com outras finalidades. Foi num desses baralhos "diferentes",de 78 cartas e figuras simbólicas, usado tanto para jogar como para ler a sorte, que Angélica foi buscar a chave de seu inquietante destino. Ainda que depois se recusasse a acreditar no que as feiticeiras videntes de Salem lhe prometiam, nas misteriosas cartas do Tarô...

"A Mulher, a Beleza, o Amor!", suspira o Cavaleiro de Malta. "Você é iluminada pelos deuses!" No alto da falésia de onde se avistava o apanhado de casinhas e fortificações de Gouldsboro diante do mar aberto, Angélica sentou-se com as feiticeiras de Salem para a leitura das cartas do Tarô. Sobre uma lápide de granito saliente, uma a uma, a vidente dispôs as laminas encantadas que tirara de uma grande bolsa de veludo: a Carroça, o Louco, a Heroína, o Arlequim, a Estrela-de-Davi... Ali estavam representadas todas as forças do Universo. Debruçada sobre seu destino, Angélica divagava, e uma leve vertigem nasceu dessa contemplação. Finalmente, para onde a levaria aquela vida errante? Alcançaria a vitória e o sucesso?
"Sua estrela é bela", comentou a jovem maga. "Mas você falará com um homem morto." Únicas a perceber o hermetismo de suas profecias encantadas, as três mulheres se inclinaram sobre a estrela mágica. Uma onda se quebrou à beira da falésia e o vento espalhou uma garoa salgada em seus cabelos. Ao longe, tudo se harmonizava nos contornos da Baía Francesa. As velas brancas dos navios e os barcos de pesca entre as ilhotas passavam devagar sobre o espelho de água. Como num sonho...

  livro 26-  O triunfo Angélica


Acima das intrigas e das paixões, o destino de um amor inigualável

Nos quase trezentos anos que se seguiram ao descobrimento da América, os franceses tentaram de todas as formas estabelecer um império colonial em terras do Novo Mundo. Desde o início do séc. XVI, quando a ação isolada de corsários e comerciantes os levou a explorar o litoral americano, até o final do séc. XVIII, quando tiveram de se retirar, cedendo ao avanço do imperialismo inglês, os franceses chegaram mesmo a estender seus domínios por um considerável território — no Brasil, nas Antilhas, na América do Norte. O auge da presença francesa na America registrou-se durante o reinado de Luís XIV, quando o Canadá passou a ser uma colônia oficial, administrada diretamente pela Coroa francesa. O comércio e o povoamento foram incentivados, fundaram-se novas cidades, firmaram-se alianças com os nativos.

Mas a terra nunca produziu as imensas riquezas ambicionadas, e a sólida presença inglesa na região acabaria por frustrar seus sonhos coloniais. Depois da Revolução, praticamente findava o poderio francês no Novo Mundo.Angélica e seu amor, o Conde Joffrey de Peyrac, viveram o auge do domínio francês em terras americanas."Depois de tudo o que passei", conclui Angélica, "o céu bem que me deve a felicidade!"
Num derradeiro gesto de esperança, Angélica correu o olhar pelo vasto horizonte ao longo da fortaleza destruída de Wapassu. Além, muito além das montanhas geladas do Canadá, do outro lado do oceano, o Conde Joffrey de Peyrac a esperava.
Numa espécie de vazio causado pela saudade e pela angústia, sua mente rodopiou numa embriaguez vertiginosa. Ilusões! Vivera apenas ilusões! Sonhara com um Novo Mundo. Trabalhara para construí-lo. Amara todos aqueles lugares: Katarunk, Wapassu, Gouldsboro, Salem, Quebec. Todos, um a um, deixados para trás.

O futuro que a aguardava era ainda um mistério, mas levaria consigo todas aquelas histórias com que preencher horas inteiras de numerosas vigílias e travessias. Reencontraria os amigos, e poderiam brindar e beber alegremente. Sua vida e sua obra não se apagariam. A lembrança de tantos momentos carregados de significados permaneceria como uma soberba promessa de felicidade. Agora seu desejo era navegar para a Europa num belo navio, numa viagem sem atropelos nem tempestades. Lá encontraria um esposo cheio de expectativas, para em seus braços se lançar, prometendo-se mutuamente uma vez mais: dali por diante, nunca mais iriam separar-se!

fonte https://www.goodreads.com/series/79103-ang-lica-marquesa-dos-anjos

4 comentários:

  1. Nossa!! eu lia alguns livros desse em 1989.. eu era criança e não entendia nada,nem sabia que havia tantos livros assim... Acabei de ver o filme, juro..meu passado voltou á tona.]Adorei pode ter encontrado esse blog

    ResponderExcluir
  2. Esse romance marcou minha adolescencia.Quando eu lia era como me transportasse para o local,a vezes me batia uma paranoia de que eu havia vivido aquilo, que eu era reencarnação dela, tamanho meu fascinio pela historia, ate hoje aos 52 anos meu coração aperta quando vejo ou leio qualquer coisa sobre. Me marcou muito.

    ResponderExcluir
  3. Li toda a coleção na minha juventude, hj com 48 anos, ainda me lembro de todas as histórias e desse romance maravilhoso entre a marquesa dos anjos e o conde de peyrac. Vou comprar a coleção novamente, a outra se perdeu no tempo.

    ResponderExcluir
  4. Esse romance marcou minha adolescência. Gostava de pensar que um dia teria um amor como o Conde Joffrey de Peyrac.
    O coração aperta de saudade quando lembro desse romance.

    ResponderExcluir

COMENTEM FRIENDS